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Além do discurso: como empresas brasileiras estão (ou não) conquistando confiança

  • Foto do escritor: Redação GoHuman
    Redação GoHuman
  • 5 de set.
  • 8 min de leitura

Maior estudo longitudinal sobre stakeholders do país revela que crise estrutural nas organizações brasileiras afeta a confiança e mostra o que as “melhores para o Brasil” fazem para se diferenciar


“No final do dia, são pessoas se relacionando com pessoas e gerando valor para outras pessoas.”


Foi assim que Pedro Paro, CEO da Humanizadas (empresa de inteligência de dados), definiu a essência dos negócios no mais recente episódio do podcast GoHuman Talks. Mas se os negócios são fundamentalmente sobre relacionamentos humanos, por que tantas empresas brasileiras estão falhando justamente nessa área?


O relatório “Melhores para o Brasil 2025”, desenvolvido pela Humanizadas, traz alguns dados que ajudam a entender…


Para começar, a pesquisa mostra que apenas 12% das empresas brasileiras promovem bem-estar real, 21% praticam diversidade genuína e 24% são percebidas como comprometidas socioambientalmente


Ou seja, um diagnóstico rápido aponta para uma crise sistêmica que abrange desde o relacionamento com colaboradores até o impacto na sociedade. Com isso, se cria um cenário em que as organizações operam muito abaixo do seu potencial de geração de valor para todos os públicos envolvidos.


Mas há luz no fim do túnel. 


As organizações reconhecidas como Melhores para o Brasil – aquelas com rating BBB ou superior na metodologia da Humanizadas* – operam em um patamar completamente diferente, com até três vezes mais promotores entre seus stakeholders. 


A pergunta que fica é: o que elas fazem de diferente?


*ENTENDA A METODOLOGIA

O estudo “Melhores para o Brasil” utiliza uma metodologia proprietária que combina três fontes de dados: escuta direta de stakeholders (colaboradores, clientes, fornecedores, sociedade e investidores), métricas de sustentabilidade e análise de dados públicos.


As empresas recebem ratings que vão de E (mais baixo) a AAA (mais elevado), similar ao sistema de classificação de risco. Apenas organizações com rating BBB ou superior são reconhecidas como “Melhores para o Brasil”.


Hu Rating

A avaliação processa mais de 100 indicadores financeiros, sociais, ambientais, culturais e de governança, utilizando inteligência artificial proprietária para cruzar dados qualitativos e quantitativos. 


Para a edição de 2025, o estudo ouviu mais de 300 mil pessoas e analisou mais de 1.200 empresas ao longo de cinco anos, o que fez desse o maior estudo longitudinal sobre stakeholders já realizado no país.


O retrato da desconfiança nas organizações brasileiras


Para compreender a dimensão da crise de confiança no Brasil, é necessário olhar além dos números gerais e analisar como ela se manifesta em diferentes aspectos da gestão organizacional. 


O que o estudo revela não são problemas pontuais, mas um padrão sistêmico de desconexão entre empresas e stakeholders, que Pedro Paro define como um “momento de esgotamento, de cansaço coletivo”.

Pedro Paro

Para começar, após anos de crescimento, a agenda ESG brasileira enfrenta sua primeira grande retração. A percepção de compromisso socioambiental despencou de 33% em 2021 para apenas 24% em 2024, confirmando o que Pedro observa no mercado: “Acho que foi uma moda, realmente. E ela passou”.


Enquanto isso, as empresas de referência mantêm 69% de promotores nesse indicador – uma diferença de 2,9 vezes que sugere não apenas uma divisão de performance, mas uma diferença fundamental de abordagem. As Melhores para o Brasil (MPB) tratam sustentabilidade como estratégia de negócio, não como tendência.


Compromisso socioambiental – Melhores para o Brasil

Quando se analisam os componentes específicos, o contraste se torna ainda mais evidente: as Melhores para o Brasil mantêm mais de 70% de promotores em responsabilidade ambiental, social, transparência e ética, enquanto o mercado nacional não ultrapassa 30% em nenhum desses temas.


Melhores para o Brasil – Compromisso socioambiental

Outro alerta crítico do estudo vem dos dados de bem-estar organizacional. Esse índice despencou de 26% em 2023 para apenas 8% em 2024 no mercado geral – uma queda de 18 pontos percentuais. Nas MPB, porém, o índice permanece em 61%, criando uma diferença de mais de cinco vezes. 


Mas o mais preocupante está nos componentes: o mercado brasileiro registra 0% de promotores em saúde física, valorização profissional e reconhecimento financeiro – números que sugerem um colapso sistêmico das condições básicas de trabalho. Enquanto isso, as Melhores para o Brasil têm 62% de promotores em saúde física, 60% em segurança psicológica e 54% em saúde mental. 

Melhores para o Brasil – Bem-estar

A agenda de diversidade, equidade e inclusão, por sua vez, também enfrenta retrocessos significativos, caindo de 40% em 2021 para 21% em 2024 no mercado geral. Mesmo nas MPB houve declínio – de 81% para 66% –, sugerindo que essa é uma agenda sob pressão em todo o ecossistema empresarial brasileiro.


Por fim, o engajamento apresenta um cenário ambíguo. Entre colaboradores, a diferença entre as MPB e o mercado é de 1,9 vezes (75% versus 39%), mas até mesmo as organizações líderes registraram queda de oito pontos percentuais. Ou seja, nem elas estão imunes ao desgaste.


Esse quadro ajuda a entender a conexão entre todos os indicadores: o que está em jogo é a erosão sistemática da confiança. Quando o bem-estar vai a zero, a diversidade retrocede e a sustentabilidade é tratada como moda passageira, a mensagem para os stakeholders é clara: “vocês não são prioridade real”.


E é justamente a confiança que explica o diferencial econômico. 


Empresas orientadas aos stakeholders alcançam retorno financeiro duas vezes superior ao Ibovespa no médio e longo prazo. “Quando eu tenho um laço de confiança com uma determinada marca, eu vou falar sobre ela, vou divulgá-la, o cliente vai divulgar, o colaborador vai divulgar. Então, as pessoas passam a ser defensoras daquela marca”, explica Pedro Paro.


Não se trata, portanto, de caridade corporativa, mas de construir negócios mais resilientes e rentáveis a partir de relações de confiança estruturadas. “As empresas que não constroem relações de confiança com seus públicos entram em um ciclo vicioso. [...] As empresas que buscam construir relações de confiança com todos os seus públicos entram num ciclo virtuoso”, resume o fundador da Humanizadas.


Esse padrão não é exclusivo do Brasil. Em outros contextos, a confiança já se consolidou como ativo estratégico central – e talvez nenhum exemplo seja tão ilustrativo quanto o da Dinamarca.


O modelo dinamarquês:

quando confiança vira vantagem competitiva


O modelo dinamarquês: quando confiança vira vantagem competitiva

Na Dinamarca, a confiança é muito mais que um valor cultural, é uma estratégia econômica. 


Um estudo da Universidade de Aarhus revela que 78% dos dinamarqueses confiam em pessoas desconhecidas, criando o que o Dr. Gert Svendsen chama de “autoesforço” – uma responsabilidade social informal em que cada um assume suas responsabilidades e todos esperam que os outros façam o mesmo.


Isso se traduz em práticas cotidianas baseadas em confiança – bicicletas estacionadas sem cadeado, bebês dormindo sozinhos na calçada enquanto as mães tomam café, empresas fechando acordos verbais em vez de contratos formais e barracas de frutas self-service funcionando apenas na base da honestidade.


Rachel Goldgrob, cofundadora da GoHuman fez uma imersão na Dinamarca para entender o modelo dinamarquês e reforça: “o alto nível de confiança que as pessoas têm umas nas outras é uma das principais razões pelas quais o país se sai tão bem nas pesquisas internacionais de felicidade.


Essa confiança, segundo ela, também aparece no ambiente corporativo. “Níveis elevados de confiança e flexibilidade e a ênfase em uma vida equilibrada contribuem para que haja mais felicidade no trabalho”, avalia.


Inclusive, antes mesmo da pandemia de Covid-19 forçar o trabalho remoto, grande parte das empresas dinamarquesas já adotava gestão baseada na confiança. 


Como explica a pesquisadora Tina Øllgaard Bentzen, o objetivo é “criar uma organização autodirigida” onde “cada profissional tornou-se uma espécie de colíder, que é convidado para a sala de reuniões e que legitimamente pode desafiar o status quo”.


Os resultados falam por si: profissionais em empresas de alta confiança relatam 74% menos estresse, 106% mais energia no trabalho, 50% mais produtividade, 76% mais engajamento e 40% menos esgotamento. Números que espelham exatamente o gap entre as empresas líderes brasileiras e o mercado nacional identificado pela Humanizadas.


A lição é clara: controle é bom, mas confiança é mais barato. E é justamente essa lógica que aproxima a experiência dinamarquesa das práticas que fazem a diferença também no Brasil.


Confiança no dia a dia:

cinco práticas que mudam a cultura


Durante o GoHuman Talks #4, Alessandra Cavalcante, cofundadora da GoHuman, e Pedro Paro, fundador da Humanizadas, reforçaram uma ideia central: confiança não se constrói com programas grandiosos, mas com práticas simples, consistentes e, muitas vezes, negligenciadas. 


Essas práticas, embora pareçam básicas, definem a diferença entre organizações que apenas falam em confiança e aquelas que de fato a cultivam no dia a dia. Entre elas, os dois destacaram estas cinco:


#1 Escuta ativa estruturada


Criar espaços em que as pessoas possam se expressar sem medo de represálias fortalece a segurança psicológica e abre caminho para a inovação. Escuta ativa não é apenas ouvir, mas garantir que diferentes opiniões sejam consideradas e respeitadas.


“Poder falar, emitir sua opinião, questionar abertamente – isso é confiança na prática”, diz Pedro.


#2 Feedback construtivo


Culturas de confiança dependem de feedback honesto e contínuo – positivo e negativo. Isso reduz ruídos, promove alinhamento entre expectativas e fortalece o senso de pertencimento, porque cada pessoa percebe que sua voz importa.


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#3 Valorização de stakeholders negligenciados


O estudo da Humanizadas mostrou que fornecedores são um dos públicos mais ignorados pelas empresas, embora tenham visão estratégica privilegiada do negócio. Quando incluídos no diálogo, eles trazem percepções únicas sobre riscos, oportunidades e eficiência, ajudando a empresa a evoluir.


#4 Comitês multidisciplinares


Alessandra Cavalcante

Reunir pessoas de diferentes áreas e perspectivas permite decisões mais robustas e alinhadas aos múltiplos stakeholders.


Como destacou Alessandra no GoHuman Talks, “é importante chamar todo mundo que está envolvido em um projeto, mas quando você fura essa bolha e traz pessoas de outras áreas, tem a chance de observar algo que não estava percebendo”


Essa capacidade de furar bolhas, aliás, é justamente o que diferencia as Melhores para o Brasil.


#5 Decisões transparentes


Até momentos difíceis, como desligamentos, podem fortalecer a confiança se conduzidos com clareza e alinhamento de valores.


Transparência evita especulações, mostra respeito e mantém a credibilidade da liderança diante do time. Como lembra Pedro Paro, “às vezes as pessoas adiam decisões e isso é de uma crueldade sem tamanho. Você não confia na pessoa, na performance, e vai excluindo, isolando. Isso é muito pior do que ter uma conversa honesta e difícil no momento certo”.


Ou seja, os dados do estudo “Melhores para o Brasil 2025” confirmam o que a experiência prática já sinalizava: empresas que investem em relações autênticas não apenas geram mais confiança – elas são mais rentáveis, resilientes e inovadoras.


“O meu chamado para as empresas é olhar para o básico e fazer o básico bem feito. É olhar se a minha empresa está gerando valor para meus stakeholders”, destaca Pedro.


As empresas que fazem a diferença não são perfeitas – elas são humanas. E é exatamente essa humanidade, traduzida em escuta genuína, transparência e cuidado real com pessoas, que constrói a confiança capaz de transformar mercados inteiros.


Como a NR-01 pode acelerar a construção de confiança


Nesse contexto, a atualização da NR-01 (Norma Regulamentadora 01), que entrou em vigor em caráter de teste em maio deste ano e que passa a valer oficialmente em maio de 2026, representa uma oportunidade única para acelerar essas transformações. 


A norma torna obrigatório o mapeamento de riscos psicossociais no trabalho, incluindo sobrecarga, falta de autonomia, insegurança no emprego e violência psicológica – todos fatores que corroem sistematicamente a confiança organizacional.

Rachel Goldgrob

Como explica Rachel Goldgrob, cofundadora da GoHuman, “quando um profissional sofre violência psicológica ou tem problemas de saúde mental agravados por conta do ambiente em que atua, a empresa é tão responsável quanto quando ele sofre um acidente de trabalho”.


Alessandra Cavalcante observa que “o desafio da NR-01 está justamente em reconhecer que muitos dos riscos psicossociais não estão nos indivíduos, mas na estrutura. E isso inclui crenças profundamente enraizadas – como a meritocracia.


Para que a norma não se torne “só mais uma burocracia”, como alerta Alessandra, as empresas precisam aproveitar essa oportunidade para questionar práticas naturalizadas. “Muito mais do que aderir a campanhas específicas, as empresas precisam se preocupar em construir uma cultura acolhedora, que tenha a saúde mental e a segurança psicológica de seus times como prioridades estratégicas", orienta.


No fim, o caminho para implementar confiança passa por aumentar a segurança psicológica, que gera no time a sensação de pertencimento e a convicção de que suas ideias não serão ridicularizadas. Afinal, como destaca Rachel, “a segurança psicológica viabiliza a criação de espaços de diálogo e de autenticidade dentro das organizações."


A GoHuman desenvolveu uma metodologia específica para essa transição. “Por meio de ferramentas e análises qualitativas, conseguimos identificar o estágio de segurança psicológica em que a equipe se encontra. Nossa metodologia aponta, então, as oportunidades diárias que podem ser trabalhadas para a segurança psicológica evoluir naquele time”, revelam Alessandra e Rachel.

Precisa de ajuda para transformar confiança e segurança psicológica em cultura? Fale com a gente.

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